Há um mês que estou trabalhando num horário melhor, cinco
horas (seguidas) por dia, de segunda a sexta. Sendo assim, tenho mais tempo
para organizar minha vida pessoal e projetos para o futuro, seja no blog, na vida
profissional e pessoal. No início, dediquei-me a planejar tudo corretamente,
tempo para isso, para aquilo, estudos pessoais, arrumação de casa, um momento
para o blog, preparar o almoço, lavar a louça, ir trabalhar, retornar, tomar um
banho, jantar, ler, dormir. E a rotina se repetia imaculada por dias a fio.
Até que um dia, por conta da alergia, eu dormi mais do que
deveria.
Até que um dia acordei faltando uma hora para estar no
trabalho.
Até que um dia, cansada, não estudei. Não li, não separei um
momento para o blog. Peguei o computador, escolhi um filme aleatório (que já
tinha visto) e assisti.
Até que um dia dormi mais tarde do que de costume, fazendo
absolutamente nada.
Até que um dia me senti culpada pela rotina quebrada.
Após assistir toda a saga da Shrek pela vigésima vez, vi os créditos nostálgicos do último
filme, com cenas dos três anteriores, e passei a pensar. Deveria me sentir culpada
pelos imprevistos da vida? Afinal, estava apenas planejando cumprir minhas
metas, fazer algo que fosse útil, ser alguém.
Mas o que pode ser classificado como útil?
Mas o que faz de uma pessoa alguém na vida?
Eu já não sou alguém?
Quer dizer, sou graduada, trabalho na área que estudei, pago
minhas contas, compro meus livros, meus produtos para o cabelo cacheado que
carrego (e tanto amo), estou num relacionamento, escrevo meus futuros livros,
mantenho um blog que dedico tempo, planejamento e, às vezes, dinheiro.
Então, o que me falta? Por que a culpa?
E, assim, lembrei-me de outra coisa, de uma conversa com um
dos meus primos que também é colega de trabalho: somos ensinados a ter. De acordo com o que nos é ensinado,
quanto mais temos, mais somos. Que o
sucesso nesta terra é pré-determinado de acordo com o valor da casa que se mora,
com o carro do ano, com a troca dos móveis feita frequentemente, com o celular
de última geração, com a mudança de roupas e sapatos de acordo com a tendência da moda.
Suspirei e lembrei-me do que consegui nos últimos dias após
a mudança de rotina e os planos terem sido deixados de lado. Viajei quatro
horas de ônibus para estar no casamento de uma prima, conheci lugares que nunca
pensei visitar. Inspirei-me, escrevi. Ouvi músicas novas. Faxinei o meu quarto,
encontrei papéis e lembranças que me fizeram sorrir, personalizei cadernos,
como gosto de fazer. Cozinhei, ri com os mesmos filmes, reencontrei amigos,
visitei outros, senti saudades.
E agora, após 451 palavras, já no finalzinho da
página, penso:
Se isso não é ser alguém então, bem, eu não sei o que é.
Foto: Ian Ricardo |
2 Comentários
Por que eu demorei tanto para ler esse post? Eu adorei!! Esses dias mesmo, eu estava conversando com um amigo sobre o que significa ser feliz. Mais recentemente ainda, hoje cedo, estava assistindo uma palestra sobre o mesmo tema. E é bem isso mesmo o que você falou: nós somos ensinados a ter. E também somos ensinadas a estar constantemente insatisfeitas com alguma coisa. Para aí podermos continuar comprando, consumindo, buscando. E é muito difícil quebrar essa mentalidade e perceber o quanto já somos felizes.
ResponderExcluirLer o seu post me fez sorrir. Ali quando você fala sobre tudo o que você tem/é (é formada na área que gosta, tem um emprego, tem namorado, PODE COMPRAR SEUS PRÓPRIOS LIVROS...), eu senti aquela pontadazinha de inveja. "Inveja do bem", claro, daquela que não deseja que o outro perca o que tem, que só gostaria de ter igual. Mas aí eu tive que rir de mim mesma. Eu posso não ter tudo isso ainda. Mas eu tenho muitas coisas que me fazem feliz. Eu sou absurdamente feliz. Para nunca me esquecer disso, no começo desse ano, eu fiz um desafio a mim mesma: eu arrumei um pote vazio e uma vez por semana, escrevo num papel uma listinha de coisas boas que me aconteceram naquela semana e coloco no pote (que eu chamo de "gratitude jar", "pote da gratidão"). É um exercício maravilhoso e eu estou super empolgada para abrir o pote no final do ano e ver tudo de bom que aconteceu comigo durante as 52 semanas deste ano. Porque o mundo sempre tenta fazer a gente esquecer o quanto é feliz. E nos esforçarmos para lembrar é uma atitude de revolta. Eu e você somos revolucionárias, amiga. ;3
Olha esse comentário ENORME! ♥
ExcluirPois é. Olha só, desde pequena que eu gostei muito de fazer as coisas, ao invés de comprar, principalmente porque certos brinquedos eram caros e, para contornar a situação e não ficar sem, minha mãe me ensinava e me ajudava a construir coisas. Enquanto fui crescendo, acabei perdendo certos costume, pois era "podada" pela sociedade, que ria das minhas coisas feitas, dos meus cadernos artesanais, das roupas das minhas bonecas que eu mesma fazia, ao invés de comprar. Agora, com o advento DIY, eu voltei a fazer coisas, não só por poupar dinheiro, mas também por gostar, nos últimos dias tenho feito muito mais coisas para relaxar (no fim, muita coisa eu acabo presenteado :P). Estou contando isso porque, se encaixa no que você disse sobre consumo. E eu fico muito mais feliz vendo as prateleiras da minha sala que eu mesma desmontei um móvel e pintei, do que se tivessem sido compradas.
Engraçado, uma outra amiga minha também sentiu isso e eu fiquei muito mal, porque não era a proposta inicial do texto, mas depois ela também me explicou isso. É só a gente entender que a trajetória de cada um independe da do outro, nossos caminhos são diferentes e está tudo bem. Eu terminei a faculdade com 21 anos, mas eu tive uma colega que começou aos 32. E tá tudo bem, porque, nossas vivências foram e são diferentes.
Amei a ideia do gratitude jar e quero saber o que estava dentro dele quando você abrir, viu?! E é bem isso, vamos revolucionar e mostrar que somos felizes sim, jogando essa fórmula pré-estabelecida e fazendo aquilo que queremos. :) ♥