Essa história foi feita como um presente para Priscila Santos do blog Lírios ao Mar
Estava frio e ela sabia bem disso. A
janela escancarada fazia com que as cortinas voassem de forma descontrolada
como se quisessem escapar dali de qualquer jeito. O vento gélido lhe tocava com
brutalidade, mas não estava nem aí pra isso. O corpo totalmente inclinado para
frente, deixando-se largar de forma desleixada sobre aquela mesa, apoiando a
testa sobre os próprios braços. Lágrimas e mais lágrimas escorriam de seus
grandes olhos negros que chegou a pensar que poderiam estragar a madeira
daquele móvel. Parecia que daquela vez não haveria volta. Ele tinha os olhos
firmes e sua expressão estava intacta ao dizer tais palavras. Sabia que era o
sonho da vida dele, da vida dos dois,
mas não era a coisa mais fácil do mundo se desfazer de tudo que havia construído
de uma hora para outra. Não quando ela tinha acabado de decolar na sua carreira
de advogada.
“Eu vou embora você querendo ou não. Se não
quer ser feliz ao meu lado, deixe que eu serei sozinho.” As palavras de DongHae ecoavam em sua mente,
acertando-lhe como um tapa na cara. Se ele seria
feliz sozinho, se referia apenas sobre sua carreira na música, não era?
Aish, por que não podiam resolver conversando como todo mundo? Não, ela tinha
que ser orgulhosa e ele tinha que ser cabeça dura. E por conta disso, agora ela
estava ali: Chorando e se martirizando por não apoiá-lo quando ele mais
precisou. Ele deveria estar tão confuso quanto ela, afinal, inúmeras foram as
vezes que lhe dera força e apoio para apresentações em casas de show e alguns
barzinhos. E agora, quando ele finalmente consegue o que tanto queria, ele lhe
dá as costas. No final das contas ela sabia que era culpada. Muito culpada. E
se ele disse coisas tão duras, não tiraria sua razão.
Você é tão louca por ele que já está
começando a se culpar por isso. Idiota. Sua consciência lhe dizia com mais um tapa na cara.
Finalmente se ergueu, encostando-se ao apoio da cadeira e deixando que a cabeça
pendesse para trás. Suspirou, tentando esvaziar sua mente pelo menos alguns
segundos. Tentativa inútil, já que a primeira coisa que lhe veio foi aquela
noite, dois meses antes. Animados, conversavam sobre o último caso que ela
tivera e quão bem sucedida tinha sido na resolução da guarda da criança.
DongHae dizia o quão orgulhoso era por ter uma noiva como ela. Sem entender o
termo que ele usou, a garota perguntou o que estava acontecendo. Uma caixinha
preta foi tirada do bolso e um pedido foi feito. Sorrisos, surtos, fotos e é
claro, inúmeros beijos. Estava mais feliz do que nunca estivera na vida. Chegava
até a ser engraçada a forma como as coisas acontecem. Seria cômico se não fosse
trágico, como diria sua mãe. Uma risada completamente sem ânimo escapou dos
lábios e então ouviu o toque do seu celular, era uma mensagem.
“Então, eu esqueci minha chave. Vem
abrir pra mim, tá? Tá, venha logo.”
Era
Bessie, uma de suas amigas mais queridas. Sorriu de canto, balançando a cabeça
para os lados como se reprovasse a atitude da mais nova, a qual praticava com
muita frequência. Levantou rapidamente como lhe fora ordenado na mensagem, ou
teria uma garota emburrada e gritando pela casa assim que abrisse a porta.
Caminhou apressadamente passando as mãos no rosto para limpar as provas de que
andou chorando recentemente. Apesar de que a amiga sabia muito bem do que
estava acontecendo, mas como a maioria das pessoas, odiava dar na cara quando
isso acontecia. A mão foi levada até a maçaneta, girando-a com cuidado assim
que a porta fora destrancada, já adornando os lábios com um pequeno sorriso
para recebê-la.
O
problema é que não era Bessie parada do lado de fora de sua casa.
No
mesmo estado – ou pior – em que ela se encontrava, DongHae estava parado a
porta com os braços cruzados com firmeza no peito, o cabelo bagunçado e as
roupas amassadas. Seus olhos estavam intactos, sem nenhuma marca de olheiras ou
de choro. Mas no fundo, ela sabia que ao menos uma lágrima havia escapado dali.
Era como se as duas orbes negras lhe dissessem isso
.
-
Er... Oi, Elizabeth. – Foi a única frase que ele conseguiu formular ao vê-la.
Mesmo que estivesse em um estado deplorável segundo a maioria, para Donghae ela
continuava linda. Os cabelos em um coque desalinhado, o moletom lilás e enorme
cobrindo-lhe quase todo o corpo, o pequeno short branco do pijama... Nada havia
mudado exceto pela tristeza presente em seus olhos, ele sabia bem porquê.
-
Oi. – Sua voz saíra rouca, entregando o que fazia segundos antes. Afastou-se em
um convite mudo para que ele entrasse e assim o fez. Ao passar ao lado dela,
DongHae pôde sentir o cheiro de seu perfume e fechou os olhos, sorrindo de
canto. Como sentiu falta daquele aroma. Caminhou rapidamente até o tão
conhecido sofá, sentando-se enquanto Elizabeth ia em direção a sua tão amada
poltrona. Estavam um de frente para o outro e ficaram assim por um longo e
torturante tempo.
-
Então... – Disse ela, suspirando levemente.
-
Não, deixe que eu começo. – Donghae a cortou, levando uma das mãos até a nuca e
coçando o local rapidamente, nervoso. – Eu estou errado, sei que estou errado.
É a chance que eu sempre... – Parou e suspirou. – que nós sempre esperamos. Mas
acima de tudo é preciso pensar em você também. Eu não posso simplesmente te
tirar do escritório que você tanto ama pra vir comigo em algo que não temos
certeza. – Elizabeth tinha os olhos arregalados, encarando-o estática, sem
acreditar no que ouvia.
-
Mas eu também não tinha o direito de...
-
Eu não terminei. – Podia até parecer grosso, mas ambos sabiam que não estava
sendo. Ele só não queria que ela se culpasse por algo que não podia. – Eu não
ouvi seus motivos, Elizabeth. E eu sei porquê... – Mas um suspiro e ele apertou
os olhos, parando por alguns segundos. A garota engoliu em seco, ela também já
imaginava a resposta e por isso continuou atenta a suas palavras. – Você é bem
sucedida em tudo que faz. E eu? Nunca fui bom em nada. A única coisa que eu sei
é cantar e mesmo assim, não é algo que mereça tanto crédito assim.
É
claro que merecia crédito, ela adorava sua voz. A forma como ele fechava os
olhos para cantar ou como ele ficava ainda mais sereno quando se deixava levar
pela melodia das músicas que ele mesmo compunha. Dentre todos os dons que eram
dados as pessoas, aos olhos de Elizabeth, ele possuía o melhor deles. Era uma
das razões que a faziam cada vez mais apaixonada por ele.
-
Eu achei que essa era a chance de deixar de ser um fracasso e ser o cara que
você merece. Mas acabei te magoando, não é? Mostrando o quão fracasso eu
realmente sou. – Mais um suspiro e então levantou do sofá, indo em direção a
poltrona que ela estava sentada. Ainda estática, Elizabeth observou todas as
suas atenções. Parou assim que chegou próximo à ela, ajoelhando-se a sua frente
e segurando suas mãos. O calor que emanou das dela o fez sorrir.
-
Não quero ser feliz sozinho. – Foi tudo que ele disse. Puxou-a pelas mãos para
que se levantasse, ficando ambos de pé e muito próximos. A mão esquerda de
DongHae repousou na cintura dela, enquanto a direita foi guiada até a bochecha,
acariciando-a com o polegar.
-
Eu não consigo ser feliz sozinho. – E finalmente, capturou os lábios dela. O
beijo fora calmo, demonstrando toda a saudade que estavam um do outro. Elizabeth
rapidamente guiou as mãos até o pescoço dele, usando das grandes unhas para
arranhá-lo de forma leve, em uma carícia.
-
Então eu serei feliz ao seu lado. – Foi tudo que ela respondeu. Não fazia a
mínima ideia de como resolveria seu emprego para se mudar com ele. Mas não era
hora de se preocupar com aquilo. Não era hora de se preocupar com nada. Estava
nos braços do homem que amava novamente e nada atrapalharia isso.
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