Poderia
ser um dia comum.
Eu
estaria nas ruas, morrendo de sono, rumando a Lotérica mais próxima para pagar
as contas de casa, já ciente da quantidade de pessoas que estariam na fila e
que levaria pelo menos meia-hora para que eu pudesse voltar para casa e sair do
calor daquele espaço.
No
meio do caminho, como algumas vezes aconteceu, eu o encontraria. Na mesma
alegria de sempre, nos cumprimentaríamos e um caloroso abraço seria dado.
- E
aí, Thiarlley, já terminou a faculdade? – Seria a sua pergunta. Eu negaria com
a cabeça.
- Termino
esse ano, se tudo der certo. – Eu daria de ombros e ele negaria com a cabeça. –
E você, hein, vai voltar quando?
- Mas
termina sim, oxente! – Ele olharia os lados como de costume e então iria coçar
a nuca, em um claro de sinal de complicação. – Rapaz, eu nem sei. Tem que ver
aí com esse FIES, né...
Nós
então mudaríamos de assunto e chegaria o que nós tanto falamos no ano passado:
São Paulo. A saudade da grande metrópole, nós falaríamos de todos os passeios
que tivemos, do preço das passagens, dos planos que tínhamos para as próximas
viagens.
- A
gente podia ir nós três juntos no mesmo voo, eu sempre vou sozinha. – Eu
falaria, claramente empolgada com a história. Ele riria com a minha empolgação.
- É
mesmo, a gente pode combinar isso então. Quando você vai? – Seria a sua
pergunta. Eu responderia que ainda nem sabia quando, mas que era provável nas
férias.
Começaríamos
então a estipular datas, possíveis linhas aéreas, e até lugares que a gente não
foi nas viagens anteriores. “Você saiu mais que eu”, “Eu nem fui no Starbucks”,
“A gente podia sair todo mundo junto”. E depois de muitos planos, nos
despediríamos, afinal, eu ainda iria pagar as contas e ele provavelmente teria
algo para fazer também. Com mais um sorriso e um aceno, diríamos “até depois” e
cada um seguiria seu rumo.
Mas a
probabilidade dessa conversa acontecer não existe mais.
Num
feriado qualquer, quando todos estavam aproveitando do descanso para se divertir
ou simplesmente relaxar, o improvável aconteceu.
Atlético
como era, ninguém nunca pensou que algo do tipo fosse acontecer justamente com
ele.
Após
uma longa partida de futebol com os amigos, ele decidiu mergulhar.
Ele
mergulhou e seu corpo retornou sem vida.
Ele
mergulhou em águas profundas o suficiente que o levaram de nós. Assim, de uma
hora para outra, tão rápido quanto um piscar de olhos.
A
garganta se fechou, a água adentrou sem o direito de estar lá e assim o levou.
E
então se foi.
Sem
nem mesmo termos tido preparo para aguentar, sem nem mesmo termos dito tudo que
queríamos, sem nem mesmo termos olhado nos olhos verdes tão brilhosos uma
última vez.
Nos
faltaram palavras na boca,
e sobrou a dor no coração.
A dor
de reorganizar a vida sem ele.
A dor
de todos os sonhos interrompidos, os planos frustrados, a vida terminada.
E o
que nos restou além disso tudo? A certeza de quem ele era. O rapaz que desde
sempre foi exemplo. Gentil, sorridente, educado, dedicado a família. Um atleta
como poucos. Atencioso, tímido algumas vezes, brincalhão quase sempre,
sonhador.
O que
nos restou foi uma saudade, meu primo, mas uma saudade que nunca vamos saciar.
Talvez
a gente acostume.
Mas
isso é só um talvez.
Em memória de Iran Valadares
25.10.1993
09.02.2016
4 Comentários
Uma das minhas Maiores Saudades!
ResponderExcluirOi, Mari! Obrigada por comentar.
ExcluirEu imagino o quanto você sente falta dele. Eu sofri muito com a morte de Iran e na minha cabeça não fazia sentido, afinal, nós não éramos tão próximos. Mas nos conhecemos desde crianças, somos parentes e, acima de tudo, ele era um menino de ouro e que tinha um futuro enorme pela frente.
Que o Senhor nos conforte, te conforte, pois sei que a saudade é grande.
Ai, que triste :( sinto muito. É difícil ficar imaginando como as coisas teriam sido, mas agora o que passou passou, e bola pra frente. Tudo acontece pra nos deixar mais fortes :)
ResponderExcluirBeijo!
http://tipsnconfessions.blogspot.com
Obrigada! As vezes eu me pego pensando em como ele estaria agora, sabe? Se teria dado certo a faculdade, se teríamos realmente viajado juntos, mas infelizmente é como você disse, bola pra frente. E sim, tudo acontece para nos deixar mais fortes.
ExcluirObrigada pelo apoio, moça! Beijos