O antirracismo saiu de moda

Manifestação pela fundação do Movimento Negro Unificado nas escadarias do Theatro Municipal de São Paulo, em 7 de julho de 1978 - Jesus Carlos 

Novembro de 2025 chegou ao fim acumulando polêmicas e “tretas” online na bolha literária. De um lado, contas criadas para enaltecer a “beleza branca”, utilizando de IA para embranquecer personagens pretos em capas de livros; de outro, influencer branco tentando se defender após conteúdo pedante, dizendo ser mais antirracista que e para uma autora negra só porque ele “ajudou um negro a ser publicado”. E por último, mas não menos importante: influencer negra expondo influencers brancos (e de perfis grandes) pelo silenciamento diante dos casos acima e de muitos outros no meio e sendo ameaçada de processo judicial por dizer o óbvio.

Tudo isso me faz pensar que, não muito tempo atrás, quando George Floyd foi morto pela polícia americana em 2020, a internet foi a loucura. Ao abrir o explorar, vários conteúdos com “imagens pretas”: o luto da comunidade negra americana foi um luto nosso, e nunca se falou tanto os termos antirracismo, racismo estrutural e vidas negras importam. Famosos brancos emprestaram seus perfis para pensadores negros discutirem racismo, programas como o “Falas Negras” passaram a existir, a pauta racial invadiu o BBB e se tornou tema sobre o programa nas redes sociais.

E o mercado literário? Entrou na onda. Fosse o tradicional ou independente, pessoas negras escrevendo, publicando e existindo na ficção e comprando essas obras estavam lá. Foi nesse contexto que publiquei três dos meus cinco livros e ‘Mulheres Negras e Literatura’ foi lançado e muito bem recebido pelo público-alvo: escritores. 

Mas o que aconteceu nos últimos cinco anos?

Nós saímos de moda. O conservadorismo crescente entre os jovens e a quantidade de pessoas que se sentem confortáveis em serem racistas nas redes relembrou o mercado literário e os influencers de que o antirracismo pode ser colocado de volta na gaveta sempre que quiserem. Ao culparem o racismo estrutural, esquecem que a estrutura foi e é feita por pessoas e que, para alterá-la, é preciso, olha só que surpresa, de pessoas. O racismo não surgiu do nada. A estrutura não se fez racista sozinha. 

E, então, nossos livros vendem menos, nossas obras são descartáveis e alteráveis com IA embranquecendo nossos personagens. Somos violentados por pessoas brancas que se dizem mais antirracistas que nós e, quando questionamos, somos ameaçados com processos judiciais.

A escritora e influencer literária Day Borges comentou sobre a falta de ação das editoras no dia 20 de novembro para além do post padrão com os livros do catálogo e questiona “Cadê os influenciadores? Cadê ações para furar a bolha? Cadê jeitos criativos de vender nossas histórias? Cadê a valorização dos profissionais negros do texto? Cadê negros em eventos? Cadê destaque no dia a dia?”.

E a resposta é simples: o antirracismo saiu de moda. Não mais interessa às grandes editoras que nossas histórias sejam contadas. Não somos mais um público lucrativo. E, no fim, voltamos ao que sempre foi: nós, escritores independentes, influencers pequenos, bolhas nas plataformas e coletividades em busca de sermos lidos, vistos e ouvidos.

Como disse a escritora Lelê Alves em suas redes: “Eu não tenho que fazer pronunciamento sobre racismo, eu falo sobre isso TODOS OS DIAS”. Por aqui, seguimos lutando para além de novembro, para além da estrutura, para além do boicote, para além da moda. Afinal, sem o privilégio do silenciamento conveniente e da consciência apenas uma vez por ano, só nos resta lutar e continuar lutando.

0 Comentários