Um dos meus primeiros cancelamentos direcionados na internet aconteceu em 2018, quando escrevi e publiquei a crônica No fim das contas, é só cabelo. No texto, falei como eu me vi presa a opinião dos outros sobre o que fazer com meu próprio cabelo, diante dos elogios que recebia constantemente. E levava a reflexão de que se eu me prendia ao que os outros pensavam e me impedia de fazer o que quisesse com cabelo, uma coisa que cresce, então algo precisava mudar antes que essa prisão se estendesse para outras áreas da minha vida.
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Foto: Mastin Labs | Film Presets (Pinterest) |
Uma moça abriu o link do post e se sentiu ofendida logo na primeira linha. Reclamou no twitter e eu me dei ao trabalho de tentar me defender. Foi o suficiente para que ela me atacasse e me xingasse e eu, que não a conhecia, fiquei sem entender o que de tão agravante existia na crônica para ofendê-la tanto.
A moça, que se deu trabalho de me atacar, mas não de se defender e para isso usou uma amiga dela que me conhecia, vivia uma situação complicada com uma familiar lutando contra o câncer e a palavra "cabelo" tinha se tornado uma dor a mais dentro do contexto em questão. A primeira linha da crônica era um recorte, um contexto dentro do todo, que a ofendeu e foi o suficiente pra ela desistir da leitura — e me atacar.
O que a moça não pareceu entender, no entanto, é que se ela tivesse terminado a leitura, talvez tivesse se sentido acalentada pelo que ali dizia. Ao ler a primeira linha, foi tomada por uma revolta e decidiu direcionar a mim — uma pessoa que ela não conhecia e que não via a sua frente — o ódio e a raiva que talvez fossem direcionadas a uma pessoa, ao momento vivido ou a situação como um todo.
Lá se vão sete anos desde que isso aconteceu e volta e meia me recordo do fato, às vezes rindo, às vezes refletindo. A situação era semelhante para nós duas: não sabíamos quem era uma outra e nem o que se passava na vida uma da outra, mas lá estava ela me atacando e lá estava eu me defendendo, numa situação que poderia ter sido evitada se déssemos uma a outra a não importância que tínhamos uma para outra.
Afinal, de novo, não nos conhecíamos e a opinião uma da outra era irrelevante de uma para com a outra.
Esse lugar, a internet como um todo, nos fez dar importância demais a pessoas e espaços que são insignificantes fora das telas. O que mudou na vida dela após aquela discussão? O que mudou na minha vida depois daquela discussão? Nada. E continua não mudando independente do assunto.
A internet deixou de ser um espaço auxiliar e se tornou protagonista, criou novos empregos, novas metas de vida, novos meios de ganhar dinheiro. Mudou a forma de estudar, de trabalhar, de se fazer política, de existir. E mudou também não só a forma que nos vemos, mas como vemos o outro.
Sete anos depois da fatídica discussão sobre um post no meu blog, me coloquei pensando sobre ela. E uma frase que se formalizou como um meme ecoa na minha cabeça: se eu sair da internet, essa questão ainda existe?
A internet sempre vai nos trazer recortes. Pedaços fragmentados do que as pessoas querem mostrar. O que nos cabe, para além de entender que são apenas recortes, é literalmente escolher nossas batalhas dentro das inúmeras discussões que aqui são geradas, dia a dia.
Para além de entender que certas questões só existem na rede, é preciso entender a nossa insignificância dentro dela. Às vezes é sobre calar o "precisamos falar sobre", porque às vezes não precisamos.
Às vezes é sobre se calar.
E, pelo amor de Deus, isso aqui é uma autocrítica.
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